segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

Atraso estrutural do Alentejo: apenas uma opinião

Aproveito este meu blog para apresentar uma reflexão sobre o atraso estrutural da região do Alentejo.
A razão desse atraso, inegável e preocupante, poderá ser procurada em diferentes factores causais, onde os níveis baixíssimos de formação académica, em minha opinião, constituem o principal motivo. É inegável que a estrutura económica, demasiado arcaica e dependente de um rudimentar sector primário, funciona como uma espécie de estigma, condicionador do desenvolvimento super-estrutural, e incapaz de abrir caminho a uma mentalidade mais aberta, mais inovadora, e menos dependente de conceitos e preceitos com reduzidos horizontes.
Têm-se atribuído ao factor interioridade a causa charneira deste atraso estrutural. É evidente que algumas relações de causa e efeito devem haver entre o distanciamento dos centros de decisão e as carências reais desta região. No entanto, a diminuição percentual dos valores do PIDAC para o Alentejo não se devem só ao factor distância, ou a esta clausura voluntária em “para além do Tejo”. Deve-se sobretudo à crescente diminuição dos efectivos humanos, à crise, à preocupante crise demográfica que desde os anos 60 se instalou como um carrasco exterminador. Ora a lógica dos decisores políticos em Lisboa é fácil de perceber: se não há pessoas, não é preciso investimento!
Banido o direito ao trabalho, por falta de investimento e de modernização económica, os jovens desde muito cedo procuram alternativas viáveis para uma vida condizente com os modelos sociais difundidos pelos diversos meios de comunicação de massas, e desde muito cedo a sua principal preocupação é abandonar o torrão de terra que os viu nascer. Vão estudar para fora, para os grandes centros urbanos, e por lá ficam a engrossar o volume de massa critica. As repercussões são claras e as consequências a médio e longo prazo estão à vista. O Alentejo é efectivamente uma das regiões mais atrasadas do conjunto de países que integram a Europa Comunitária.
Os índices de criatividade social na região continuam a descer dramaticamente, e o pior é que o poder local não tem sabido encontrar soluções capazes de provocarem a viragem nesta conjuntura de longa duração.
Mais preocupados com o preenchimento de quadros públicos com familiares, amigos e apoiantes que lhes garantam a reeleição, do que com a “ coisa pública”, a maioria dos autarcas alentejanos esquece-se da realidade da sua terra, despoja-se da entrega altruísta a uma causa colectiva, e preocupa-se quase exclusivamente com o granjeio de uma carreira que o leve a deputado. Uma vez na Assembleia ouve, cala e consente, que é o melhor que tem a fazer para não causar espanto e admiração à intelectualidade do hemiciclo.
Qualquer cidadão sabe que o processo de desenvolvimento económico a nível planetário passou já por uma série de etapas e revoluções, estando a última, a das tecnologias de ponta, da cibernética e ciências de computação actualmente em curso. Ora, também é verdade que no Alentejo nem sequer passou pela indispensável revolução agrícola, factor determinante para a passagem ao ciclo de investimento industrial. Não passou, e os resultados estão à vista: baixo nível de infra-estruturas rodoviárias, débil desenvolvimento urbano, fraca escolaridade, pouca abertura social e etc. É forçoso aqui fazer uma ressalva e chamar a atenção para a realidade global do país, realidade essa que inevitavelmente determina o processo de desenvolvimento local, mas esse é outro assunto que intencionalmente não pretendo tocar.
Confrontando-nos então com a actual realidade, que percebemos? Em primeiro lugar que o Alentejo é estruturalmente atrasado porque a globalidade do pais também o é, e em segundo lugar porque esse atraso se deve fundamente ao facto de nesta região nunca se ter processado uma verdadeira revolução agrícola, industrial e de mentalidades, de forma a gerar ambivalências sociais e um processo equitativo de redistribuição da riqueza. No entanto, não podemos olvidar que o país se manteve durante quarenta anos debaixo da pata de um ditador de curtos horizontes. A nossa história democrática contemporânea resume-se a pouco mais de vinte e nove anos, tempo suficiente, apesar de tudo, para se ter posto “mãos à obra”.
Mas porque estamos assim atrasados, sem gente, sem massa critica, sem jovens empresários, sem infra-estruturas, sem centros urbanos dinamizadores de investimento, sem uma cobertura aceitável de centros hospitalares e sem escolas devidamente equipadas e servidoras de um ensino de qualidade, vamos deixar extinguir o “País Maravilhoso”?
Se as causas do actual atraso estrutural são muitas e de diferentes origens, que só por si davam para um longo trabalho de sociologia, o futuro parece não estar a ser enquadrado como muito mais risonho. É certo e sabido que alguns ”picos” de industrialização que num ou noutro sítio às vezes estalam de forma demagógica e com consequências pouco significativas para as populações, não servem para o Alentejo. Com uma agricultura arruinada, sem dinâmica humana, sem indústria e com um fraco comércio, a região corre o sério risco de se transformar numa coutada para os senhores citadinos virem enterrar o stress de uma semana de trabalho, ou então para virem aspirar o ar puro da esteva enquanto debruam as cartucheiras com coelhos e perdizes.
E as pessoas de cá? Os últimos resistentes? Vão continuar indefinidamente com o embaraço das palavras atafulhadas na garganta, vão calar indefinidamente o seu sotaque “alentejanês”? Vão continuar a achar graça a tudo o que venha de fora, esquecendo os objectos da riqueza do seu ser?
No entanto, mesmo sem comércio, sem agricultura e sem indústria, o Alentejo pode-se desenvolver! Pode-se desenvolver de forma equilibrada, sem impactos negativos, de forma racional e moderna.
Segundo alguns dados da Nações Unidas o turismo será a actividade mais importante do mundo no séc. XXI, sendo já responsável por uma cifra superior aos 6% de todos os postos de trabalho actualmente existentes. O turismo, direccionado cada vez mais para uma sociedade do lazer, é uma das revoluções económicas que está em curso, e mais uma vez o Alentejo assiste impávida e serenamente à passagem do comboio!...Que medidas autárquicas têm sido tomadas para a implementação de uma política direccionada ao desenvolvimento integrado do turismo regional? Nenhumas! Alguns dos autarcas não sabem como o devem fazer, e outros, o que é mais grave, nunca sequer pensaram no assunto. Ora o desenvolvimento da actividade turística tem que ser apoiada num número diversificado de sinergias que vão desde os recursos ambientais, à cultura, ao património, para só falar nas sinergias em que somos verdadeiramente ricos. Por exemplo, que preocupações autárquicas têm sido reveladas relativamente ao património arquitectónico e arqueológico? - refiro estes por serem os mais emblemáticos e ao mesmo tempo aqueles que reúnem mais potencialidades para fomentar o dito turismo cultural. Quantos gabinetes técnicos foram formados nas autarquias para o apoio e o desenvolvimento de projectos de dinamização dos recursos patrimoniais, ambientais ou culturais?
Os pelouros da cultura continuam a ser o parente pobre dos executivos em acção. A vulgar atitude machista dos nossos políticos locais (conhecem alguma presidente de Câmara no Alentejo?), muito frequentemente atribuem esse pelouro a mulheres com pouca experiência política, naturalmente por acharem que a cultura é o “circo” necessário e complementar do pão que paternalmente a mão larga do chefe distribui aos seu correligionários e apoiantes. Os pelouros da cultura têm-se revelado, sem excepção, absolutamente obsoletos, inoperacionais, despesistas e vulgarmente festivos, quando deveriam ser os pelouros charneira de uma dinâmica transformista. Isto só para sublinhar, como refere Sérgio Godinho, que as “coisas andam todas ligadas”; e uma região como Alentejo que pode e deve levar um impulso de desenvolvimento a partir do sector turístico tem, inevitavelmente, que actuar a nível da sua cultura e do que mais genuíno possui.
Acho que me alonguei demasiado neste meu “post”, peço perdão e votos de compreensão. Mesmo assim muitas coisas ficaram por dizer. Talvez para a próxima.